quarta-feira, 26 de março de 2008

RESENHA DE LIVROS - TERAPIA DE VIDAS PASSADAS, QUEBRA DE MALDIÇÕES HEREDITÁRIAS


Livio Tulio Pincherle, ed., Terapia de Vida Passada: Uma Abordagem Profunda do Inconsciente (São Paulo: Summus Editorial, 1990) 194 pp.;

Brian Weiss, A Cura através da Terapia de Vidas Passadas (Rio de Janeiro: Salamandra Consultoria Editorial Ltda., 1996); original em inglês Through Time into Healing (1996) 206 pp.;

Robson Rodovalho, Quebrando as Maldições Hereditárias (Goiânia: Koinonia Comunidade e Edições Ltda., 1991) 79 pp.


A resenha conjunta destes três livros justifica-se por estar em moda o assunto TVP - Terapia de Vidas Passadas. O mesmo foi iniciado pelo Morris Nethertn, e espantosamente divulgado por Brian L. Weiss, que assessora a Rede Globo de Televisão na telenovela "Anjo de Mim". Além disso, considero que os princípios da TVP estão implícitos na "teologia" que serve de suporte ao conceito de "quebra de maldições hereditárias." Meu alvo com a resenha detas obras é alertar o povo evangélico reformado sobre esse elemento espírita no seio da Igreja de Cristo.

O movimento TVP não é novo no Brasil, pois a ABTVP - Associação Brasileira de Terapia de Vidas Passadas, foi fundada em fins de 1987. Segundo Pincherle afirma em Terapia de Vida Passada (pp. 35-36):

No Brasil, apesar de ser um país católico, a influência do espiritismo, e também do espiritualismo de linhas africanas é muito forte, portanto encontra-se uma aceitação bastante ampla no âmbito popular. Um outro fato que fez com que a TVP fosse bem recebida entre os nossos pacientes é a decepção com a psicanálise, muito lenta e sem rumo.

Sabemos que o movimento paralelo de "quebra de maldições hereditárias" também tem os mesmos argumentos. O Brasil, afirmam seus seguidores, tem em sua base "espíritos" de escravidão e luxúria, entre outros "canais" condutores das maldições. Rodovalho afirma: "Foi nesse ambiente que crescemos. Essas desigualdades são reflexos dos princípios onde fomos gerados; eles estão em nossos genes" (pp. 59-60).

O livro Terapia de Vida Passada tem como escritores os doutores: Dirce Barsottini, Ermínia Prado Godoy, Livio Tulio Pincherle, Maria Elisa dos Santos, Maria Teodora Guimarães, Michel C. Maluf, Ricardo Mazzonetto e Tirço José Meluzzi Filho. A julgar pelo título, parece-nos que esses catedráticos em psiquiatria, psicoterapia e psicologia se dispõem a abordar, em mesa-redonda, as profundezas do inconsciente humano. Mero engano de quem compra o livro pela capa e título. Afirmando que

Há necessidade de psicoterapias mais ativas e mais rápidas, apesar do fato de que profissionais psicoterapeutas ainda acreditam que somente poderão ser alcançados resultados de uma forma lenta e gradual. Terapias sem limites não cabem mais num mundo em evolução rápida (p. 9),

esses autores defendem o espiritismo, do início ao fim, como forma de acelerar a cura dos clientes, definindo psicoterapia da seguinte forma: "As psicoterapias são, portanto, modificáveis e só existe um limite: não ser nocivo para o cliente" (p. 10). Entendem que a regressão a vidas passadas só serve para melhorar a compreensão do presente (p. 152). O uso da hipnose é fundamental para a liberação do subconsciente e a entrada no campo das vidas passadas.

Além do exposto, o livro se destina a relatar fatos de regressões e "curas maravilhosas" de pessoas que descobriram que seus problemas aconteceram num passado distante. A cura só acontece, entretanto, ao se descobrir que em outra vida o sofrimento também aconteceu; e para isto, é preciso que se regrida a uma outra vida, mais passada ainda, para se descobrir a origem do problema. O livro ensina algumas técnicas de hipnose e em uma delas indica o apoio de músicas "... como a terpsícore-transe-terapia de Ackstein, que usa ritmos provindos da umbanda..." Um fato irônico é a afirmação de que "... lembro que nós, psiquiatras e psicólogos, geralmente fomos ‘bruxos’ e ‘sacerdotes’ em alguma vida anterior" (p. 42).

A definição principal que Weiss dá para TVP é a seguinte:

A terapia de regressão a vidas passadas combina a especificidade e a catarse curativa, que é o que há de melhor na terapia freudiana, com a participação curativa e o reconhecimento do profundo significado simbólico que é a marca registrada de Jung (A Cura através da Terapia de Vidas Passadas, p. 28).

No capítulo 2, que trata sobre Hipnose e Regressão, Weiss mostra-se muito incoerente em suas afirmações sobre o estado hipnótico. Na página 23 diz: "Estamos em hipnose sempre que a relação habitual entre mente consciente e a inconsciência é subvertida, de modo que o subconsciente assuma um papel mais dominante." Na mesma página, logo abaixo, afirma: "Apesar do contato subconsciente profundo, sua mente pode comentar, criticar e censurar". Já na página 25, suas afirmações sobre o estado hipnótico mudam: "Na hipnose sua mente permanece alerta e observadora," e mais: "A mente atual está consciente, observadora, analítica". Pergunto: afinal de contas, o meu subconsciente domina o meu consciente na hipnose, ou é o consciente que permanece ativo e dominador? Esta é a grande dúvida a que chegamos. Weiss afirma que de "50 para 70%" do sucesso na regressão está reservado para as sessões pré-hipnóticas, onde o terapeuta deve vasculhar a mente do seu paciente:

Antes que o processo hipnótico possa ser iniciado, um terapeuta de regressão competente investirá um bom tempo levantando a história do paciente, fazendo perguntas, obtendo respostas e entrando muito especificamente e com riqueza de detalhes em áreas particulares importantes (p. 29, grifo meu).

E para isso estabelece dois padrões de regressão: a clássica e a de momentos-chaves. Na primeira, o paciente recorda-se de todos o momentos de suas vidas passadas; já na segunda recorda-se apenas dos "... momentos mais importantes e relevantes de um leque de existências, os que melhor irão elucidar o trauma oculto e curar o paciente mais rápida e poderosamente" (p. 33). O que mais nos chama a atenção é o fato de Weiss contradizer-se sempre em as suas informações importantes. Na página 29, ainda, ele diz: "Portanto, não recomendo terapia de regressão feita por um terapeuta que não seja registrado ou credenciado por uma entidade tradicional autorizada, que não tenha uma formação especializada ou níveis de pós-graduação..."; ele encerra o parágrafo dizendo que os terapeutas heterodoxos são "... menos propensos a deixar uma lembrança evoluir no ritmo necessário...", e justifica dizendo que eles não tem a "...perícia adequada para ajudar o paciente a integrar o material." Mas logo na primeira frase do parágrafo seguinte, Weiss afirma: "Fazer regressão a vidas passadas sozinho em casa, contudo, é benéfico e relaxante na maioria das vezes", e para isso ele usa o apêndice do livro, páginas 195-201, para nos ensinar a gravar a nossa própria fita de regressão. Afinal, é perigoso ou não fazer regressão com quem não é especializado? Ficamos, novamente, na dúvida. Weiss emprega os demais capítulos (3-11) mencionando casos ocorridos em seu consultório e nos ambulatórios de várias Universidades americanas onde trabalhou, e onde tem amigos.

Resumindo numa frase o que é o tema do livro: precisamos recordar, em vidas passadas, quantas vezes sofremos as mesmas dores e onde elas começaram, pois só assim nos livraremos delas para sempre.

Não cremos ser exagero afirmar que a "teologia das maldições hereditárias" nada mais ensina que a regressão a vidas passadas. Veja o que afirma Rodovalho:

Portanto não nos culpemos ou sintamos discriminados se Deus tinha milhões de opções dentre espermatozóides e o óvulo que ele poderia ter usado. Ele utilizou aquele que possuía aqueles genes e o resultado saiu você, com toda essa carga genética que lhe foi transmitida. O que devemos fazer, é perceber quais as cargas genéticas que são positivas e precisam ser aproveitadas, e as heranças negativas que precisam ser quebradas pela oração e pela busca de Deus" (Quebrando as Maldições Hereditárias, p. 29, grifos meus).

Rodovalho defende que o culpado pelas nossas cargas negativas de maldições não é outro senão o próprio Deus, e sendo assim, nós meros mortais, precisamos quebrar aquilo que Deus escolheu para nós, ou seja, nossas características genéticas negativas. Estudando bem a "teologia das maldições hereditárias", chegaremos à conclusão de que a parte amaldiçoada das almas de nossos antepassados vieram "via genes" nos amaldiçoar e contradizer o que Ezequiel 18.19-24 nos ensina com tanta propriedade. Na página 75, falando sobre as orações que devemos fazer, o primeiro passo é: "Devemos quebrar as maldições com oração e confissão de pecados públicos e hereditários". Sem respeitar qualquer lei de análise histórica e exegética, o autor usa Daniel 10.2-3 para afirmar que o profeta pediu perdão pelos pecados de seus antepassados, incluindo-se também como culpado dos erros deles (p. 75), e justifica afirmando: "Ele se identificou, para haver confissão. E precisamos fazer o mesmo". Ele termina o parágrafo dizendo: "Precisamos orar, assumindo o pecado que foi feito por nossos antepassados, confessando-os e nos arrependendo deles. Então Deus nos perdoará."

Rodovalho, na introdução de seu livro, ensina como devemos fazer a nossa "árvore genealógica", afirmando que devemos nos recordar de muitos detalhes específicos das vidas de nossos antepassados. Sabemos que Jesus disse que o pecado não é apenas o que se pratica, mas também o que se pensa (Mt 5.28). Sendo assim, devemos, segundo Rodovalho, descobrir o que nossos antepassados pecaram pensando. A isso o Dr. Weiss chama de regressão a momentos-chaves, pois, segundo ele, o estado hipnótico leve acontece todas as vezes que estamos concentrados em alguma coisa (p. 22).

Uma coisa boa nos livros é o fato aparente de que nenhum cristão-reformado passou pelas terapias de vidas passadas. Os autores insistem em dizer, na ficha de muitos de seus pacientes apresentados nos livros, que os mesmos são católicos ou não praticantes de religiões.

A conclusão final é: "De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o contentamento" (1 Tm 6.6), pois bem sabemos que a nossa mente é altamente sugestionável, e que, quando estamos relaxados e sempre embalados por músicas ritmico-melodiosas, nossos músculos e sentimentos afloram e nossas fantasias mais íntimas emergem dominando o nosso consciente.

por, Vagner Bernardi

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